segunda-feira, 11 de abril de 2011

A ESCOLA LITERÁRIA, O AUTOR E A OBRA.

Análise crítica de João Kassahara.

A Escola Literária e o Autor podem ser determinantes na interpretação da obra?

    Decerto, uma obra literária pode ser o resultado do seu tempo e do pensamento do autor naquele momento, mas, no que diz respeito à criatividade e focos diversos deste, a obra pode tomar duplo sentido ou rumos contraditórios ao esperado. Um escritor, por meio do seu narrador, pode criar várias histórias sem se prender à sua época, pode morar no polo sul, dentro do seu iglu, e falar de fogo e calor, como também, pode ter uma imagem social correta e ser hipócrita. Os textos podem apresentar múltiplos narradores e sentidos.

    Muitos generalizam as obras do dramaturgo, escritor e músico Chico Buarque, como sendo uma alusão à Ditadura Militar. As críticas ao Regime Militar no Brasil foram temas do autor em 1969 nas canções "Apesar de você" e "Cálice". Porém, a Canção "A Rita" foi elaborada em 1965, época aproximada do casamento com a atriz Marieta Severo. A palavra "Rita" parece um fragmento de "Ditadura" e "Marieta", coincidentemente (pesquisei datas e nomes na internet). Chico pode ter construído a canção "A Rita" associando estes dois referentes ("Ditadura" e "Marieta").

    Esses fenômenos quando explícitos ou implícitos no tempo e espaço influenciam na interpretação. O leitor não conhecendo a origem da canção (ou sabendo que o autor está vivo), torna a interpretação livre. Quando ligada à Ditadura, a torna vinculada à censura. Se associada à Marieta Severo, faz acreditar que Chico teve conflitos passionais (atualmente vivem separados). Caso o leitor conheça as duas fontes, pode asserir que o fato e o sentimento se interrelacionam de qualquer forma, em níveis diferentes. Por isso, é importante uma referência temporal e espacial na interpretação de qualquer obra: uma data ou um fato.

    Outro item observado na canção são os sentidos das palavras, frases e discursos que se aproximam, se afastam, se assemelham e se diferenciam. Nota-se que as polissemias, sinonímias, antonímias e os outros recursos dos sentidos entre palavras se estendem entre as frases e entre os textos. Formando-se assim, uma cadeia de Hiperônimos e hipônimos de sentidos. Portanto, as interpretações literárias são pássaros que pousam de mãos em mãos, e se vão. Num amaranhado de semas.

    Nos versos 1 e 2 "A Rita levou meu sorriso No sorriso dela" Aparecem polissemia nas palavra sorriso = felicidade, e sorriso = poder. Sendo também uma expressão homônimas, ou seja, o mesmo som e grafia, mas sentidos diferentes.

    No 6º verso "E Arrancou-me do peito". é uma metonímia: tirou a minha liberdade

    No verso 8 "Levou seu retrato, seu trapo, seu prato". Neste paralelismo revela-se a Paranomásia, que é significantes com imagens acústicas (impressão) semelhantes, construídos a partir do tema implícito Pertences Pessoais. Sendo este um possível hiperônimo dos hipônimos: retrato, trapo, prato.

    Nos versos 10 e 11 "Uma imagem de são Francisco" "E um bom disco de Noel". Este é uma metonímia (disco de música do Cantor Noel Rosa) e aquele é uma alegoria de fé.

No verso 12 "A Rita matou nosso amor". Essa transposição é uma metonímia ou transnominação: Rita destruiu nossa paixão.

    Nos versos 14 e 15 deixou e levou (como parado e movimento) formam um sentido de Antonímia ( forma uma aproximação com a antítese e o paradoxo).

    No verso 17 "Mas causou perdas e danos". Perdas e danos remetem a prejuízo de qualquer natureza, portanto, pode-se dizer semanticamente que são sinonímias (têm uma aproximação com as comparações, metáforas, metonímias).

    Nos versos 23 e 24 "Me deixou mudo Um violão" A personificação tece um violão calado, triste e sem ânimo, representando o sentimento do homem.

    Abaixo faço uma comparação semântica em direção as vertentes: Ditadura e Marieta Severo.

A Rita
(Chico Buarque de Hollanda)

 

Semas com traços da Ditadura

Semas com traços da Marieta (esposa)

A Rita levou meu sorriso

Levou minha felicidade

Ela é muito sorridente. Me deixou

No sorriso dela meu assunto

Se mantém no meu silêncio

Levou um pouco de mim

Levou junto com ela
O que me é de direito
Arrancou-me do peito e tem mais

Tirou a Liberdade de expressar minha opinião

Levou junto com ela a esperança de casar e ser feliz – direito de todo homem. Acabou com os meus sonhos.

Levou seu retrato, seu trato
Seus trapos, que papel !

Levou à sua maneira, seu jeito, seus erros. Algo escrito, uma mensagem

Levou sua imagem, seu companheirismo, seus defeitos, que encenação teatral (é atriz)

Uma imagem de São Francisco

Levou a fé / esperança

Fé / esperança

E um bom disco de Noel

Prazer na arte, na amizade

Prazer no amor

A Rita matou nosso amor de vingança

Acabou com a Arte por vingança.

Rita se vingou de um erro que cometi.

E nem herança deixou

Não deixas nada de bom

Nem filhos eu tenho com ela

Não levou um tostão

Não levou bens materiais

Nada levou

Porque não tinha não

Não os tinha

Somos jovens

mas causou perdas e danos

Prejuízos

Perdi com isso

Levou os meus planos

Sonhos

Planos de uma família

Meus pobres enganos

Ilusões

Meus sonhos

Os meus vinte anos

Ele nasceu em 1944 - Início da ditadura de 1964
a 1985

Desde novo sonhava tanto com este romance.

E o meu coração E além de tudo

E o meu sentimento.

E o meu sentimento.

Me deixou mudo O violão

Sem vida, sem ânimo, sem expressão

Sem vida, sem ânimo, sem vontades.


 

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